segunda-feira, 29 de julho de 2013

No churrasco

O churrasco já estava rolando quando ele chegou, carregando uma caixinha de cerveja, que é uma espécie de convite, passe, para entrar nos churrascos de hoje em dia. Já de cara, antes mesmo de encontrar o dono do churrasco, já avistou ela no cantinho, com um copo plástico na mão, olhando para o chato do violão, aquele tem em todo churrasco, não importa se de rico ou de pobre, ele sempre está lá com as suas musicas de quatro notas, ele carrega o violão no porta-malas do carro, para o caso de ir em algum churrasco. Ela não conversava com ninguém, apenas observava o musico. Ele correu até a cozinha e entregou o convite (a caixinha de cerveja) para a namorada do dono da festa, cumprimentou as pessoas que estavam na cozinha, preparando vinagrete, maionese, salada de tomate, foi até a churrasqueira cumprimentar reverenciar o churrasqueiro com o seu paninho no ombro, voltou pela cozinha, pegou uma das latinhas que ele mesmo trouxe e voltou para a sala. Ela continuava na mesma posição. Ela o viu só agora. Ele balança a cabeça dando um desses cumprimentos mundiais, que funciona em qualquer país, ela devolveu. Ele viu os conhecidos que estavam na sala e foi cumprimentando de uma forma que a cada um que ele falasse avançasse uma casa até a moça do cantinho. Como num vídeo game. Foi indo de oi em oi, “tudo bem e você”, “quanto tempo”, “vamos marcar alguma”, até chegar ao lado dela. Mais uma balançada de cabeça.
- Tudo bem, Paulo. – estendeu a mão.
- Tudo e você, Mari. – estendeu também.
Silencio. Só o musico entoando legião urbana, o deus dos caras com violão nos churrascos do mundo.
- Quer uma cerveja?
- Obrigado, mas estou dirigindo.
“uuuh” a torcida grita.
Silencio. Mais uma do legião.
- Sou amigo intimo do churrasqueiro, pedi pra ele reservar o melhor pedaço de picanha para nós. Sabe como é né, influencias. – arriscou uma piada e sorriu.
- Eu também sou amiga dele.
- Opa, então vamos nos dar bem, não vai sobrar carne boa para mais ninguém.
- Mas eu sou vegetariana.
“uuuh”. Mais uma dessa e ele está fora.
Silencio. O musico começa outra musica, dessa vez não é do Legião. É do Rei.
- Essa musica vai para minha gata.
Fala e da uma piscada para a moça, do cantinho, com o copo plástico na mão. Ela só podia ser alguma coisa dele mesmo para aguentar um pout-pourri do Legião.
Ele só olha para ela e sai. Pensando que deve urgentemente aprender a tocar violão.

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Um garoto está perto da churrasqueira, um senhor mais velho se aproxima.
- Cade o churrasqueiro?
- Sou eu.
- Oi?
- Eu que vou assar, só estou esperando o álcool pra acender o fogo.
- você?
- Sim.
- Mas você tem quantos anos?
- 21.
- E vai assar a carne.
O garoto faz que sim com a cabeça.
- Amor.
- Oi?
- Vamos embora.
- Mas por que, acabamos de chegar.
- O churrasqueiro tem 21 anos.

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Se a santa ceia fosse um churrasco: Jesus teria dividido o pão de alho e a maionese, teria transformado agua em cerveja, os doze apóstolos tocariam pagode, teria sido citado mais gente, já que churrasco você chama doze vem 30. E teria ao menos um cachorro na história.

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No churrasco todo mundo tem uma técnica para acender o fogo da churrasqueira, pena que nenhuma leva menos do que meia hora. Segundo especialistas existem mais de 500 tecnicas para acender o fogo contabilizadas até agora, só no Brasil.

Tudo estava pronto para iniciar o churrasco, a cerveja já estava gelada, a vinagrete temperada, a maionese (de ovo cru, a mais tradicional, aquela com salmonela) já estava na geladeira. Agora só faltava acender o fogo da churrasqueira.
- Deixa que eu acendo.
- Não, não, não.
- O quê?
- somos seus convidados, é seu primeiro churrasco, não precisa passar por isso.
- Isso o quê?
- passar a vergonha de não conseguir acender o fogo da churrasqueira.
- Mas...
- Não tem mas.
- Deixa que a gente faz isso, não quero ver você desesperado, abanando com uma tampa na mão.
- Deus o livre.
- Que isso pessoal, eu sou o dono do churrasco.
- Shi! – coloca o dedo na boca do anfitrião – deixa que eu acendo. Clara, pega um pão amanhecido e óleo por favor.
- Pão e óleo?
- Não conhecem essa técnica?
- Não.
- Ufa, sorte de você que eu estou aqui.
Vai com o pão e óleo na churrasqueira. Tasca fogo e nada. Mais uma vez e nada.
- Clara tem certeza que isso é pão amanhecido? Só da certo com pão amanhecido. Pão novo não rola.
- Pedro, sai dai, deixa que eu boto fogo. Vou usar a técnica dos sete palitos.
- Sete palitos? – perguntam os três amigos em uníssono.
- Isso mesmo, é uma técnica de familia, faz o fogo pegar uniforme, transforma a carne. Deixa acem com gosto de mignon, tudo graças aos sete fósforos.
- Caramba.
- Clara pega a caixa de fosforo.
- O fogão é elétrico. Tem isqueiro, serve? – grita a clara lá da cozinha.
- Não, tem que ser fosforo.
- não tem. – responde clara.
- Nem pra acender as velinhas.
- Eles são ateus.
Silencio.
- Não tem problema Marlon, deixa que eu acendo. – vem o anfitrião amparar o amigo.
- Não, não. ainda falta eu tentar. Deixei os amadores se manifestar mostrar como eu sou humilde, sou tão bom que chego a ser humilde.
Os três amigos balançam a cabeça.
- Esse fogo já era pra ter sido aceso a sete dias atrás, se era pra ser um churrasco descente. Agora vou ter que tirar o atraso, só vou fazer isso porque é o seu primeiro churrasco, casa nova, ta todo mundo feliz, então não quero isso acabe por culpa de vocês. Agora o negocio é o seguinte, vou precisar de maçarico, tronco de imbuia seco, cortado em retângulos equiláteros.
- Oi?
- Preciso disso para acender o fogo e arrumar a sua cagada.
- Não tenho nada disso.
- Desculpa, então não vou poder ajudar.
Nesse momento, vem da cozinha, a mulher do dono do churrasco.
- Já tem alguma coisa ai pras meninas beliscar lá dentro?
Olha para a churrasqueira está vazia e apagada.
- O que aconteceu?
- Nós falhamos, não conseguimos acender o fogo.
- Se você esperar até amanhã cedo o pão amanhecer eu resolvo isso.
Ela vai até a churrasqueira e liga. É uma churrasqueira elétrica. Nem fala nada e sai balançando a cabeça.

- Era por isso que eu insisti para deixarem que eu acendesse.