Na
estrada indo viajar. O pai está dirigindo, a mãe de copiloto, dormindo, e o
filho atrás, entediado, já que o vídeo game portátil ficou sem bateria. Ele lê
todas as placas as quais passa.
-
Pai.
-
Reinaldo, já está chegando.
-
Que bom. Mas eu não ia perguntar isso.
- Ah
não?
-
Não.
- O
que era então?
-
Qual é a diferença de hotel e motel.
Por
alguns segundos perde o controle e atropela umas tartarugas. Acorda a mulher.
-
Já, chegamos, já chegamos?
-
Ainda não. – responde o filho lá de trás.
A
mulher olha para o marido e volta a dormir.
Silencio.
- E
ai pai?
- O
quê?
-
Qual é a diferença?
-
Qual é a diferença entre hotel e motel?
Silencio.
Olha pelo retrovisor, o filho está esperando uma resposta.
- A
diferença é uma letra. Um se escreve com H e o outro com M.
-
Só?
-
Só.
Silencio.
-
Mas por que o um se escreve com H e o outro com M?
Mais
algumas tartarugas.
- Eu
to acordada. – a copiloto pula no banco.
Pai
e filho olham para a mãe. Ela volta a dormir.
Silencio.
- Já
sei.
- O
quê?
-
Porque um se escreve com H e o outro com M.
O
pai pergunta com medo.
-
Por quê?
-
Por que Motel é pra menina. E hotel é para menino.
O pai
respira aliviado.
Silencio.
-
Pai!
-
Oi?
Silencio.
-
Falta muito?
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Passa
das duas da manhã. Os dois param no hotel, no meio do nada, praticamente
juntos. Ele no carro dele, ela no dela. Ela está indo visitar um amigo, ele
está indo ver um cliente. A chuva forte mais a neblina faz com que os dois se
encontrem ali lado a lado esperando para ser atendido.
Ele
toca a sineta, daquelas antigas, mesmo o hotel não sendo tão antigo, toca pela
décima vez, ela olha para ele com ar de reprovação. O recepcionista, que pela
cara estava dormindo, vem lentamente.
- No
que posso ajudar o casal.
-
Não somos um casal.
- É
não somos.
-
Ok, no que posso ajudar, individualmente?
-
Isso daqui é um hotel? – pergunta num tom irônico.
-
Sim. – responde sem captar a ironia, ainda está no ritmo do sono.
- O
que a gente iria querer as duas e meia da manhã.
-
Ah!!!
Entra
no sistema.
- Só
tenho um quarto.
-
Um?
-
Um?
-
Um. O hotel está lotado.
-
Lotado? Esse hotel?
-
Sim.
- Quem
é que se hospeda no meio do nada.
-
Congresso.
-
Aqui que congresso?
- Sim,
aqui. É secreto. O senhor veio para o congresso?
-
Não.
-
Então não posso falar.
Silencio.
-
Ok, eu vou ficar com o quarto. – Ela fala interrompendo o silencio dos dois.
- Eu
cheguei primeiro.
-
Não, nós chegamos juntos.
-
Ta, mas eu apertei a sineta primeiro.
- Eu
teria apertado se você tivesse parado um segundo de apertar.
- Eu
ouvi na primeira. – interrompe o recepcionista.
- E
por que não veio?
-
Achei que fosse um sonho.
Silencio.
-
Deixa eu ficar, estou cansada.
- Eu
também estou.
-
Nossa, onde está o cavalheirismo?
- Eu
nem te conheço.
-
Desde quando para ser cavalheiro precisa conhecer?
-
Ela está certa. – vem o recepcionista em defesa.
-
Tem algum hotel aqui perto?
-
Tem, vou dar uma ligada.
Vai
para a salinha. Os dois ficam em silencio, o clima é mais pesado dentro do
hotel do que fora. Alguns minutos depois o recepcionista retorna.
- É,
todos lotados. Congresso.
-
Mas que congresso é esse?
- A
senhora veio para o congresso?
-
Não.
- Então
não posso falar.
Silencio.
- E
agora?
- vocês
podem dividir o quarto.
-
Mas eu não conheço ele. Vai saber se ele não é um assassino.
-
Ei, nem eu te conheço, vai saber se você não é uma assassina.
- A,
devo ser mesmo.
O recepcionista
já está irritado, e louco para voltar a dormir, interrompe.
- É,
pelo jeito não vai poder ficar com nenhum dos dois.
-
Como não, eu cheguei primeiro.
-
Nós chegamos juntos.
- Ah,
é que eu tinha visto errado, não tem mais nenhum quarto, eu achei que tinha
mais estava enganado, sinto muito.
Fala
e volta para a salinha, deixando os dois sozinhos na recepção.
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O hotel
é um mundo deles, eles criaram aquilo, eles podem cobrar 9 reais numa agua. Os hotéis
se mantem com o que é vendido no frigobar. Assim como o Bobs é sustentado pelo
milk shake e os aeroportos pelos pães de queijo e cafezinho.
Eles
não estão te obrigando a pegar, apenas deixando ao seu alcance.
O casal
está sentado de frente para o frigobar.
- e
se a gente abrisse só para ver o que tem dentro.
-
Não. não.
-
Mas amor.
-
Mas amor é uma óva. Lembra da ultima vez que abrimos o frigobar quanto deu a
conta.
-
Mas é só pra ver...
-
Não existe só pra ver. Se vermos vamos saber o que tem dentro, sabendo o que
tem dentro ficaremos com vontade, não vamos dormir e acabar assaltando a
geladeira a noite.
-
Nossa amor, é só um frigobar.
-
Não é só um frigobar. Não diga isso. Isso não é um frigobar. É a personificação
do diabo em forma de uma mini-geladeira. Nós somos Jesus no deserto e o
frigobar é o diabo nos oferecendo pão.
-
Mas e se...
-
Não tem mas, já falei!
Ele se
revolta, vai até o telefone.
- O
que você esta fazendo?
-
Vou dar um jeito nisso agora.
Alguém
atende do outro lado.
-
Alo, gostaria de mudar de quarto... não, não, não aconteceu nada... é porque eu
quero um quarto sem frigobar... não tem... nenhum? (silencio) Então faz o
seguinte, fecha a conta para mim.
A mulher
fica sem entender nada.
-
Por que você fez isso.
-
Não vou deixar ser tentado de novo. Vamos para outro lugar.
-
Mas você vai gastar dinheiro pagando uma nova diária.
-
Não tem problema, pelo menos vou vencer o frigobar... e outra a diária vai ser
mais barata do que um refrigerante de frigobar.