segunda-feira, 26 de março de 2012

Diga xis

As fotos antigamente eram tiradas em datas comemorativos, momentos especiais, festas, etc. para depois serem reveladas, guardadas em caixas de sapato velha, colocada em cima de um guarda roupa e normalmente mexem nelas nas faxinas de fim do ano. Um dos raros momentos que se ve uma família reunida hoje em dia.

- Pai, quem é esse daqui?
- Sou eu!
- Não, sério pai...
- To falando sério filha. O papai também já foi novo.
- Foi, mas nem tanto assim.
- Sem graça.
- Mas o que aconteceu com o senhor pai?
- Como assim, o que aconteceu comigo?
- Por que ficou desse jeito.
- Desse jeito?
- Eu vou ficar assim também pai? – fala e começa a chorar.
- Que jeito?
- Desse jeito. – soluça – igual o senhor tá!
- Como eu to?
- Mal pai... Ma – chora como se alguém tivesse batido nela. – Mal pai!
A mãe entra na sala.
- Aroldo, o que ta acontecendo. Por que você bateu na menina?
- Eu não bati. Eu tava procurando um boleto em cima do guarda roupas, ela começou a mexer nas fotos e começou a chorar.
A mulher olha desconfiada. Então vai acudir a filha.
- O que aconteceu filha, fala pra mamãe, o papai te bateu?
- Eu não bati nela!
- Deixa ela falar!
- Nã-nã-não. – fala entre as lagrimas.
- Então o que aconteceu?
- Eu não... Não... não quero ficar igual ao papai. – cai no choro encostada no ombro da mãe.
- Como assim filha?
- É que o pa-pa-pai... era bonito quando era criança, agora ta mal!
- É. – concorda a mãe.
- Como assim to mal. Por que eu to mal? – o pai se apalpa.
- Aroldo, vai pra lá, você está assustando a menina.
Aroldo sai da sala batendo o pé. Aos poucos a filha se acalma. Aroldo está sozinho na cozinha quando ouve um choro vindo do quarto. Corre pra ver o que é.
- O que aconteceu?
- Ela viu uma foto minha.
E a criança desaba a chorar.

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- Nossa, olha como era seu cabelo amor.
- Putz, nem me fale.
- Quem imaginava que você ia ficar careca.
- É...
- Olha essa, parece garoto propaganda de comercial de shampoo.
- Saudades!
- Olha essa...
- Hum...
- Sabia que eu me apaixonei pelo seu cabelo?!
- Ãhm?
- Eu, só fiquei com você a primeira vez por causa do seu cabelo, queria ver se ele era real.
Da risadas.
- É sério. Eu e as minhas amigas comentávamos. ‘Não pode ser real’. ‘É muito perfeito’.
- Sério?
- Sim. Fiquei com você uma vez, aí outra e outra, quando vi não conseguia mais sair de perto do seu cabelo.
- Sinto muito amor!
- Não, eu sabia que um dia isso iria acontecer, mais cedo ou mais tarde.
- Pena que foi tão cedo.
- Pena. Olha essa, eu tentando comer seu cabelo.
- Eram bons tempos, que eu ainda tinha cabelos e a sua bunda não era caída.
- Oi?
- Nada... Nada...
“Bons tempos... Bons tempos”. - pensa ela, triste.

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Dudalina está mexendo nas fotos, empoeiradas que estava numa caixa no fundo de um guarda-roupas. Então se deparou com a foto de alguém que ela não sabia quem era.

- Donava.
Silencio.
- Donava!
- Oi?
- Vem cá.
- Oi? – diz Donava, entrando no quarto com o controle de TV na mão.
- Quem é esse?
Donava olha pra foto.
- Não é o tio Antonio?
- Não, o tio Antonio é mais velho. Olha ele aqui. – mostra outra foto.
- Não, esse é o tio Astolfo.
- Que tio Astolfo?
- Esse tio Astolfo. – tira uma foto de dentro da caixa e mostra.
- Não esse é o tio Tião.
- Claro que não. Esse é o tio tião. Esse é o tio Astolfo.
A mãe entra na sala secando as mãos nas pernas.
- O que ta acontecendo?
- Quem é esse?
- Esse é o seu tio Tião.
- Não, esse é o Tio Antonio.
- Não, esse é o Astolfo. Esse é o tio tião.
- Claro que não. Esse é o tio Astolfo, esse é o tio tião e esse é o tio antonio!
- Negativo. Esse é o tio Astolfo, esse é o tio antonio e esse é o tio tião.
O pai chega em casa do serviço e vai direto para o quarto.
- Opa reunião de família?
- Pai né que esse é o tio Astolfo, esse é o tio antonio e esse é o tio tião?
- Né que não pai! Né que esse é o tio Antonio, esse é o tio tião e esse é o tio Astolfo.
- Meu deus vocês querem saber mais do que a sua mãe. Esse é o tio tião, esse é o tio Astolfo e esse é o tio antonio.
Silencio.
- E aí. Qual é pai?
- Nenhum, esse álbum de fotos não é nosso. É do Carlinhos. Ta comigo a muito tempo, peguei por causa de uma foto.
Todos ficam decepcionados.

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Depois de tirar uma foto com o celular ele, exclama ou melhor reclama.
- Sabe de uma coisa...
- Oi? – pergunta ela, olhando para a câmera.
- Eu gostava mais da época que as fotos vinham contadas.
- Ãhm?
- Antigamente era mais emocionante tirar foto.
- Por que?
- Por que você ficava na expectativa de como ia sair a foto, tinha um numero limitado de fotos.
- Aí que chato.
- Sério, não tinha esse negócio de ficar voltando toda hora.
- Ah eu prefiro agora.
- Hoje em dia ninguém mais fala xis. O xis tá em extinção.
- É, isso é verdade.
- As fotos saiam muito melhores por causa do xis. O xis era o diferencial.
- Que exagero.
- As fotos eram divididas em as que falaram xis e as que não falaram xis.
Ela da risadas.
- Valorizávamos mais as fotos. Não tirávamos tantas. Piscou piscou meu amigo. Vai ser zoado lá na frente.
- é né!
- é!
- Então vamos tirar outra por que eu pisquei.
- É disso que eu to falando! – fala indignado.
- Diga xis!

domingo, 18 de março de 2012

Leão marinho

Uma das primeiras lições a se aprender sobre um relacionamento é: que se a sua mulher não gosta de alguém, automaticamente você também não gosta.

- Não sei por que, mas eu não vou com a cara do Marquinho.
- Ué, por que?
- Acabei de falar, que não sei o por que!
- Estranho ele é gente boa, nos trata sempre muito bem.
- É, eu sei...
- Faz de tudo pra nos agradar...
- É... é...
- Sempre solicito, atencioso...
Silencio
- Vai ver é isso!
- O que?
- Por ele ser tão assim, solicito, atencioso, tudo isso. Eu fico com pé atrás.
- Por quê?
- Não sei, não tem motivos pra ele ser assim. Acabou de nos conhecer!
- Você ta viajando!
- Pode ser, mas que eu não gosto dele, eu não gosto.
- Besteira.
- Pode até ser, mas eu não quero você com ele pra cima e pra baixo.
- Ué, por que amor? Ele é gente boa!
- Por que eu não gosto dele.
- Só por isso eu não posso gostar.
- Bem, você sabe o que faz.
Silencio.
Esteban começa a dar uns beijinhos no pescoço de Luiza, que o afasta.
- Nem comece.
- O que foi?
- Não sei, vai perguntar pro Marquinhos, ele não é o ‘gente boa’.
Vira para o lado e cobre-se até o pescoço.

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- Pedro não gostei nada do jeito que você tava olhando para Kikinha.
- Que jeito que eu tava olhando pra ela?
- Você sabe muito bem o jeito.
- Não tava olhando de jeito nenhum, tava tentando ver o sinal.
- Sinal? Que história essa?
- Do truco!
- Mas precisava piscar pra ela!
- Sim, eu tava com o gato!
- Ah tava com o gato? A vez que eu queria adotar um gato você me encheu o saco.
- Mas não é esse gato que eu falando.
- Que gato é esse então, é algum apelidinho entre vocês dois?
- Não, é a carta, a que virou... Não tem nada a ver com o gato bicho!
- Então por que deram esse nome?
- Não sei, é do jogo!
- Sei, sei...
Silencio.
- O que é que foi aquilo
- Aquilo o que?
- Ela te chamando pra ir conversar a sós...
- Ãhm?
- Eu vi muito bem a hora que ela ergueu a sobrancelha pra você.
- Ela tinha espada?
- Que papo é esse de espada?
- É a segunda carta mais forte...
- Não quero saber do jogo. – interrompe – quero saber que papo é esse de espada.
- Justamente, é do jogo.
- Sei, sei...
Silencio.
- Se é do jogo, por que você respondeu tanto faz?
- Tanto faz?
- É. Ela ergueu a sobrancelha você chacoalhou os ombrinhos que nem uma bichinha...
Ele cai no riso.
- Do que você está rindo?
- É que eu tava com três.
- Sei, sei...
Ele continua rindo. Ela fica em silencio.
- Da próxima vez vamos jogar Pifi!

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Ela está sentada tentando adivinhar quem é, e ele está fazendo a mimica.
- Tubarão, tubarão...
Ele acena com a cabeça falando que não. Coloca as mãos em frente a boca e fica abrindo e fechando.
- Piranha, piranha.
Faz que não de novo com a cabeça. Abre um dos braços e gira ele em volta da cabeça.
- Cabeça, redonda, em volta.
Ele faz que não. E continua fazendo o movimento.
- Girando, pelo, cabelo, juba.
Pela primeira vez ele faz que sim com a cabeça. Ele coloca as mãos em frente a boca, novamente, e repete o movimento de abrir e fecha-las.
- Boca.
Ele faz que sim. Faz o movimento da juba e em seguida o da boca.
- Cabelo na boca.
Balança a cabeça dizendo não. E fica repetindo o movimento.
- Boca no cabelo.
Balança a cabeça cada vez com mais força.
- Cabelo na comida.
Pitagoras para.
- Cabelo na comida Vanessa?
“ih perderam, perderam, não pode falar” – grita os amigos em coro.
- Eu achei que era.
- Como assim?
- Ué, quando eu falei cabelo você falou que estava certo.
- Não era o cabelo, era a juba. Juba. – faz o movimento com o braço contornando a cabeça.
- Eu achei que era cabelo.
- Mas mesmo assim, como conseguiu chegar no cabelo na comida.
- Ué, falei cabelo você falou que sim, depois boca, também. Tinha que chutar alguma coisa.
- É mimica sobre animais Vanessa.
- Ah Pitagoras, eu sei, mas eu fiquei desesperada. E eu não sei o que você está falando. Suas mimicas também não ajudam muito.
- O que, fui campeão de mimica com a Carolzinha.
- Então da próxima vez vai jogar mimica com ela. – levante, pega a bolsa e sai do apartamento.
Todos olham torto e fazem uma cara que nem precisa ser bom em mimica pra identificar que ele fez besteira. Antes que a porta do elevador feche ele entra.
- Desculpa amor, eu não queria falar aquilo. Mas sabe como eu levo a sério mimica.
Silencio.
- Não queria perder de novo. Por isso agi daquela forma.
Silencio.
- Vamos voltar lá, eu vou ter mais paciência.
Silencio.
- Me perdoa, você é a melhor dupla que eu já tive. Se você quiser nem precisamos mais jogar. Abdico da mimica por você.
Silencio.
Ela resolve voltar junto com ele.
- Qual era o animal que você estava fazendo?
- Esquece.
- Qual era?
- Leão marinho!
- Hum, sabia!

segunda-feira, 5 de março de 2012

Casal sarau

Estava cada um numa sala diferente. Marina com o homem na sala 1, e o Valter com a mulher na sala 2.
Marina estava numa sala toda branca, com apenas uma mesa, uma cadeira e um espelho, daqueles com o fundo falso. Se você algum dia estiver numa sala dessa não tire carne do dente, cutuque o nariz, esprema uma espinha, ou qualquer outra coisa dessas nojentas que nós costumamos fazer de frente ao espelho, por que provavelmente tem alguém do outro lado te assistindo.

Sala 1
- E aí como você conheceu ele?
- Como eu conheci. Nós estávamos num sarau. Lembra do sarau?
- Não!
- Como não? Do sarau, fechavam um barracão e o usavam pra dar a festa. Tinha uns que eram num espaço menor, aí cada um tinha que levar uma coisa, essa era mais conhecida como “festa americana”. Não sei por que esse nome, nunca vi um americano pedindo pra eu levar alguma coisa na casa dele...
- Atenha-se a pergunta.
- Ta, desculpa. Então, quando eu cheguei na festa nem notei ele. Mas aí ele começou a dançar.
- Dançar como?
- Como um idiota.
- Ãhm?!
- É, lembro que quando ele foi pra pista pela primeira vez, alguns minutos depois o DJ parou a musica e pediu, no microfone, pra alguém chamar uma ambulância por que tinha um homem tendo uma convulsão na pista. A festa inteira parou pra ver. Na verdade se tratava do Valter dançando.

Enquanto isso Valter estava na sala 2, dividindo a parede com a da Marina.
- Como você conheceu ela? – perguntou a loira arrumando o cabelo.
- Ela quem?
- Sua mulher.
- Minha mulher, que minha mulher? Eu não sou casado! – escondendo a aliança com a mão direita.

Assistindo a tudo por trás dos espelhos estavam três médicos especialistas em comportamento e relacionamento.

Sala 1
- Depois de ele explicar para os paramédicos que estava tudo bem, a festa continuou. Porém proibiram-no de dançar. Lembro até hoje da carinha dele, sentado sozinho num canto enquanto todos dançavam, “trás a caçamba, trás a caçamba.”.
- Já entendi, continua a história.

A mulher estava de costas para o Valter, gesticulando para o espelho, tentando se comunicar com os doutores do outro lado. Pela movimentação da mão ela estava pedindo ajuda.

Sala 2
- E aí, o que você vai fazer depois que sairmos daqui.
- Senhor, sua mulher está na sala ao lado.
- Ela consegue me ver?
- Não.
- Me ouvir?
- Não.
- Então.
Silêncio

Sala 1
- Onde eu parei mesmo?
- Nele sozinho num canto...
- Ah é. Ai, você tinha que ver a carinha dele. Ele consegue qualquer coisa de mim fazendo aquela carinha. E o desgraçado sabe disso.
- Senhora?!
- Oi
Silencio.
- Ah!

Sala 2
- Eu preciso saber da história de vocês?
- Pra que saber da minha história se a gente pode criar uma nova.
- Da para o senhor sentar?
- Ah, desculpa, é que eu me expresso melhor de pé.
- Como a conheceu?
- Tem que me ver dançando.

 Sala 1
- Ele estava lá tomando uma tubaína. Eu como tenho um coração grande fui falar com ele.
- Certo.
- Caramba tubaína. Nunca mais vi tubaína, por que será que pararam de fabricar. Lembra que vinha numa garrafa de cerveja?!
O homem vira para o espelho e faz uma cara de desespero.

Na sala 2, de pé, valter dava os primeiros passos.
- Vem comigo.
- Senhor...
- Sua uma musica.
- E quem disse que pra dançar precisa de musica?
Pulando para um lado e para o outro fazendo a mulher recuar cada vez mais.

Sala 1
- Alô, mãe?... Pai, chama a mãe aí... Chama ela...
Esticou o dedo para o homem, fazendo um gesto que ia ser rapidinho, antes que ele começasse a reclamar.

Sala 2
- Vem é facinho.
A mulher faz não com a cabeça.
- Sabia que eu ganhei um premio como melhor dançarino no sarau? Eu era tão bom, que nem me deixaram entrar mais na pista pra não humilhar quem não sabia.

Sala 1
- Oh mãe, sabe por que não tem mais tubaína pra vender?... É aquelas que vinha numa garrafa de cerveja... O que? No bar que o pai vai tem... Não acredito... – sorri e estende o dedão como se fosse algo positivo para o homem. – Compra pra mim que eu vou jantar aí hoje! – tira o telefone da boca e o tampa com a mão. – vai demorar muito aqui? – o homem faz que não, desanimadamente, com a cabeça. – Pode comprar daqui a pouco to chegando aí.

Sala 2
Valter está caído no chão.
- Aí deu câimbra. Deu câimbra.
A mulher aperta o botão vermelho, fazendo com que a porta se abra.
- Eu devia ter alongado antes.
Entra uns homens na sala.
- Não, não preciso de ajuda não. É só fazer uma massagem. A moça ali resolve.
Os dois homens de branco olha para a mulher. Ela acena a cabeça, desesperadamente, falando que não. Nem pensar. Nunca. Nem morta.

Sala 1
- Não acredito que lá tem. Sabe quanto tempo faz que eu não via tubaína. Nossa o Valter vai ficar louco quando eu disser. Será que o Valter lembra, acho que ele nem lembra, do jeito que a cabeça dele nem lembra. Nossa eu to ficando velha mesmo. Sou do tempo da tubaína.
O homem levanta e aperta o botão vermelho, a porta abre-se, ele sai, dando por encerrada a sessão.

Marina e Valter encontram-se no corredor saindo da sala.
- E aí, como foi?
- Nada demais, me fizeram umas perguntas.
- Que perguntas?
- A varias né Marina, não vou lembrar de todas. E pra você?
- Pra mim ele só fez uma e nem deixou eu responder direito, ficava toda hora me interrompendo.
- É, pelo menos nos pagaram.
- É.
Silencio. Os dois vão andando, lado a lado, Valter mancando.
- Por que você está mancando?
- Não sei, acho que deu câimbra.
- E, ta ficando velho mesmo.
Os dois riem.
- Ah, vamos jantar lá na mamãe hoje.
- Ah Marina...
- Ela vai comprar tubaína.
- Caralho, tubaína, ainda existe?
Seguiram Marina falando e Valter mancando.

Na sala onde os médicos estavam.
- É, vamos ter que voltar a fazer os testes com os animais mesmo.

quinta-feira, 1 de março de 2012

pai de primeira viagem

Pioco estava no bar quando recebeu a mensagem da mulher avisando que estava gravida.
- Caramba! – fala ele calando todos na mesa.
- O que foi?
- Aconteceu alguma coisa?
Silencio.
- Minha mulher ta gravida!
- O que?
- A Francis, acabou de me mandar uma mensagem, dizendo que ta gravida.
- Sério?
- Sim.
- E ela já sabe quem é o pai?
Todos riem.
- Não acredito.
Cria-se um murmúrio na mesa.
- Gente eu vou ser pai.
- Um brinde ao novo pai da mesa.
Todos erguem os copos.
- Afinal de contas pai é aquele que cria.
Todos riem novamente. Um dos amigos que estava no banheiro chega a mesa.
- O que está acontecendo?
- O Pioco vai ser pai!
- Caraca, parabéns. Já contou pra Francis?
Todos caem no riso novamente.
- Pra comemorar o novo pai da mesa, vou pedir uma rodada na minha conta!
“opa, aí é bonito” – se ouve em todos os cantos da mesa.
- Pra mim, me ve uma água.
Todos ficam sérios.
- Oi?
- Sabe como é agora vou ser pai, não posso ficar bebendo por aí.
- Mas não vai tomar nem uma pra comemorar?
- Não, já bebi demais nessa vida. Tenho que começar a me cuidar, agora não sou só eu no mundo. Tem uma vida que depende de mim.
- Falou bonito, hein.
Todos bebem, felizes. Chega outra mensagem no celular. Ele abre: Era brincadeira, primeiro de abril, já passou de meia noite.
Ele fica sério. Pega um copo. Enche de cerveja e começa a beber, todos em volta estranham.
- Aconteceu alguma coisa?
- Disse que não ia beber...
- É que eu tava pensando aqui, como eu vou ser pai sendo que eu sou estéril.
Todos ficam sérios na mesa. Parece que até a musica de fundo para de tocar.
- Brincadeira, eu não sou não, primeiro de abril!
Soltando a tensão que tinha ficado depois da noticia, todos na mesa respiram alegres novamente, até a musica volta a tocar. E Pioco continua bebendo em silencio. Com o gosto da sensação boa que teve a pouco pensando que realmente seria pai.

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- Eu quero só ver se ele vai falar primeiro papai ou mamãe, o que você acha que ele vai falar?
Silencio.
- Amor!
Silencio.
- Amor!
Silencio.
- Claudio!
- Oi... – acorda dando um pulo – vai ganhar, vai ganhar, pega a bolsa que eu pego a barriga!
- Não vou ganhar, calma, eu to só de cinco meses.
- Ah é... – deita-se – Ta com desejo de comer alguma coisa?
- Não!
- Tem certeza? Aquele sorvete de picanha, que você me fez ir comprar ontem de madrugada, ainda está inteiro na geladeira.
- Não quero não.
- Nem o churrasco com calda de chocolate? Lembra que você me fez comprar quando tava passando o jogo e quando eu cheguei com ele disse que a vontade tinha passado?
- Lembro, mas não quero não.
- E a vitamina de banana com cebola?
- Me deixou enjoada.
- Isso que você nem provou.
- É...
Silencio. Ele volta a cochilar.
- Amor!
- Que foi?
- O que será que nosso filho vai ser quando crescer.
- Não tenho a mínima idéia.
- Nossa Claudio, você não ta nenhum pouco empolgado com essa criança né?! Se quiser pode ir embora que eu me viro sozinha, não preciso de um pai pra criar ele.
Silencio.
- Claudio, você ta dormindo?
- Não!
- Nossa não da pra contar com você mesmo, to aqui toda preocupada com o futuro da criança e você aí dormindo. Mas deixe, quando ela entender das coisas eu vou contar tudo...
Silencio. Um suspiro longo ao fundo.
- Claudio! – grita.
Claudio da um pulo da cama.
- Estourou a bolsa, corre, quer dizer não corre que é pior, deixa que eu corro. – e saiu correndo pela porta.

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- E quando ela começar a falar.
- Espera aí. – a interrompe. – Quem disse que vai ser ela?
- Eu!
- Como assim você?
- Ué, eu sou a mãe, sexto sentido de mãe.
- É, mas você pode estar enganada, pode ser ele.
- Não pode não.
- Por que não?
- Por que a minha barriga ta muito pontuda.
- E o que é que tem?
- Barriga pontuda é sinal de que é uma menina.
- Por que?
- Não sei, todo mundo diz.
- Todo mundo quem?
- Aí todo mundo Ariosto. Todo mundo!
- E se todo mundo tiver enganado.
- Como assim todo mundo tiver enganado, não tem como todo mundo estar enganado. Se todo mundo falou que barriga pontuda é sinal que é uma menina, é por que todo mundo ta certo.
- Eu não sei, prefiro, não acreditar em todo mundo.
- Ariosto, você não quer uma menina?
- Não é que eu não quero uma menina, é que sei lá nunca criei uma menina.
- E por acaso um menino você já criou?
- Já!
- Já Ariosto, você tem um filho por fora...
- Não, não... Eu já criei um menino, eu! Eu já fui um menino.
- Nossa grande criação.
- Ei! – geme ofendido.

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A mulher está deitada no parque, com a barrigona de fora, alisando como um gordo depois de um almoço farto.
- Amor fala com ele.
- Com ele quem? – olha em volta.
- Com o Arthurzinho!
- Mas ele não nasceu ainda.
- Ah, amor.
- Denise eu não vou falar com uma barriga.
- Não é uma barriga, é seu filho.
- Não é uma barriga, na qual meu filho está dentro.
- Ah fala amor. Ele deve achar que eu sou mãe solteira.
- Ele nem sabe o que é mãe solteira.
- É, mas se você não falar com ele agora, quando ele nascer vai descobrir por que não vai mais ter o pai por perto.
- Amooor...
- Fala com ele.
Silencio. Ela olha com aquela cara que só uma mãe sabe fazer. Sem dizer uma palavra, mas dando a entender tudo. Ele se aproxima da barriga. Da uma olhada em volta pra ver se ninguém está vendo, mesmo eles estando sozinhos em casa. Fica parado com a boca aberta, mas não sai nada.
- Fala!
- Calma, nunca conversei com ele. Tenho que pensar bem o que vou falar.
Silencio.
- Fala caramba!
- Porra!
Ela levanta.
- Ah essa é a primeira coisa que quer que seu filho escute de você? Porra!
- Amor, foi sem querer.
Ela sai da sala e segue para o quarto. Fecha a porta.
- Amor, desculpa, eu tava com vergonha.
Silencio.
- Não quis falar por mal. Filho desculpa o papai!
- Ele não quer assunto com você!
Silencio.
- Desculpa!
Silencio.
- Ah, quer saber eu não queria falar com o seu umbigo mesmo!
Vira as costas.
- Ele ouviu isso Manuel, ele ouviu isso!