terça-feira, 28 de janeiro de 2014

DEMARCANDO TERRITÓRIO

Ele da mais uma verificada em tudo pra ver se está tudo certo, se não deixou nada escapar, antes da chegada da esposa. Ela chega de viagem depois de deixar o marido por uma semana em casa sozinho, “tomando conta”. Ela nem da oi direito, vai direto para o banheiro, está apertada.
- Oi amor?, comigo ta tudo bem sim, também tava morrendo de saudades, a viagem foi ótima.
- Estou apertada.
Ele leva as malas dela para o quarto.
Ela grita do banheiro.
- Mario Augusto, o que é isso daqui?
Ele vai para o banheiro.
- Não sei, o que comeu no voo?
Ele abre a porta ela está apontando para o registro do chuveiro.
- O registro...
“Puta merda o registro” – ele pensa.
- Tou falando o que está pendurado no registro.
- você sabe muito bem, coloca isso ai ha dez anos.
- sim, coloco, mas essa não é minha.
- vai ver é minha.
- Espero, para o seu bem, que seja.
- é sua amor.
- Não me chame de amor, não é minha. Você trouxe mulher pra dentro dessa casa enquanto eu estive fora?
Silencio.
Ela aponta para a calcinha.
- Mario Augusto.
Ele fica em silencio.
Ela vai para o quarto.
Ele vai atrás dela.
- Me desculpa amor.
- Já falei para não me chamar de amor. Que golpe baixo Mario Augusto.
- Desculpa.
- colocar uma mulher dentro da nossa própria casa, no nosso quarto, na nossa cama. Até ai até que vai. Mas agora deixar ela pendurar a calcinha no meu registro, isso já foi demais.

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A mãe chega para a filha pequena.
- Filha, sei que você é novinha, não entende muito das coisas, mas já é hora de você aprender uma coisa que a sua bisavó ensinou para sua avó, que ensinou pra sua mãe e eu vou ensinar pra você.
A filha pequena não entende o peso do que está para aprender.
- Sempre que tomar banho pendure a calcinha no registro do chuveiro.

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O marido está no sofá, o outro marido senta.
- acho que a gente precisa conversar.
- Nossa.
Desliga a televisão.
- Que sério, o que houve?
- Acho que preciso de um tempo.
- Oi?
- Um tempo.
- tempo, como assim tempo.
- nos separarmos, ver se é isso mesmo o que a gente quer, se sentimos a falta um do outro.
- Mas nós nos casamos, quando você disse sim, achei que era isso mesmo o que queria.
- Sim, era.
- Como assim era?
- É que eu preciso pensar mais um pouco.
- Você conheceu outra pessoa? Pode falar. Conheceu né. O que é? Um enfermeiro, arquiteto, jogador de futebol... ele é mais bonito que eu? Mais rico?
- Não é nada disso.
- É sim, pode falar, eu aguento. Aguento ser trocado.
- Não, não é isso.
- O que é então?
- É por causa da cueca que você deixou no registro do chuveiro.
- Oi?
- Isso mesmo. A cueca.
- Mas eu deixei lá para secar.
- Não, não tem como secar no banheiro, não bate o sol lá. Só molha mais.
- Ta bom, desculpa, eu não vou fazer mais.
- Vai, eu sei que vai, minha ex-mulher fazia isso. Ela deixava a calcinha lá. Falei no começo do relacionamento, ela disse a mesma coisa e não tirou, as calcinhas foram aumentando de tamanho, mas continuavam indo para o registro. Sua cueca lá lembrou muito a calcinha dos últimos anos de casado. Me despertou uma coisa ruim. É a história se repetindo.
- Me desculpa.
- Sabe porquê eu virei homossexual?
- como assim virou, ninguém vira, você nasceu.
- Não, eu virei. Virei pra não ter mais que aguentar mulher pendurando calcinha no registro do chuveiro.
Silencio.
- Minhas coisas já estão prontas. Se puder fazer um ultimo favor pra mim.
- O quê?
- quero tomar um banho antes de ir, pode tirar aquela cueca do registro pra eu poder ligar o chuveiro.

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No cabelereiro
- Já colocou a calcinha no registro?
- calcinha no registro?
- É, do banheiro, registro do chuveiro.
- Ah!, não, não.
- há quanto tempo vocês já estão juntos?
- vão fazer dois anos.
- Que estão morando juntos?
- Morando juntos seis meses.
- E ainda não?
- Não.
- Pelo jeito já sabemos quem manda em casa.
- Oi? – ri nervosa. – não temos disso em casa.
- Tem sim, você que acha que não, e ele prefere que você continue pensando assim, pra ele é melhor. Sem calcinha no registro.
Silencio.
- Não tem nada a ver, eu não coloquei porque não tenho esse habito.
- “Não tenho esse habito, não tenho esse habito”, me poupe. Não se trata de habito, se trata de mostrar quem manda.
- Será?
- Sim. Quem manda no controle da televisão do quarto?
- ainda não temos televisão no quarto, vamos comprar mês que vem.
- então ainda da tempo de você reverter esse quadro.
Silencio.
Ela pega a bolsa e levanta, sem nem terminar o que estava fazendo no cabelo.
- Pera aí, onde você vai?

- Pra casa tomar banho.

domingo, 26 de janeiro de 2014

CONTROLE REMOTO

Casamentos tem a duração de um pilha num controle remoto de televisão.

Casamento é como controle remoto de televisão, não adianta você apertar os botões mais forte, tem que trocar as pilhas.

Os relacionamentos eram muito melhores antes de terem inventado a televisão com controle remoto. 

O controle remoto é a representação de quem manda na casa.
É o “anel” do senhor dos anéis, o precioso.

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O casal está deitado na cama. A mulher trocando de canal freneticamente. O marido só olhando. Após dez anos assistindo a mulher não assistindo nada, ele resolve falar.
- Eu quero terminar com você.
Ela para de zapear e olha pra ele.
- Oi?
- Eu não quero mais.
Ela troca de canal.
- Não quer mais o quê?
Troca de novo.
- Ficar com você!
- para de brincadeira, amanhã temos que acordar cedo.
Fala e volta a trocar de canal.
- Não é brincadeira. Eu não quero mais. Amanhã vou arrumar minhas coisas e ir embora.
Ela para novamente.
- você está falando sério mesmo?
- Sim.
- Você arrumou outra pessoa?
- Não. Não. nunca. Nunca te trai.
- Lucio, por favor.
- Juro, não tenho outra pessoa.
- Então por que isso agora?
Troca de canal mais três vezes só nesse meio tempo entre a pergunta e a espera da resposta.
- Porque eu não aguento mais isso.
Aponta para a televisão.
- Isso o quê?
Troca de canal.
- Isso.
- Não estou entendendo.
- Isso de você não conseguir assistir um canal só.
- Mas eu consigo. Troco nos intervalos.
- Intervalos de trinta em trinta segundo.
Ela troca de canal.
- viu?
- É porque naquele canal não estava passando nada.
- Não está passando nada ha dez anos.
- Como assim?
- Há dez anos você faz isso. Eu não aguento mais. Você aperta tanto este botão que eu tenho que trocar as pilhas uma vez por semana. Eu não quero mais isso. Eu cansei. Quero poder assistir um canal só. Não ligo pra intervalo. Eu assisto os comerciais, alias nem sei mais como funcionam.
- Nossa, pra quê tudo isso, era só você ter pedido o controle remoto.
- Eu já pedi.
- Quando?
- pedi por cinco anos, “amor, empresta o controle rapidinho”, “amor, deixa nesse canal ta passando um fil...”, e não conseguia nem terminar a frase. Mas hoje foi o limite, pra mim deu. Eu vou embora.
- Mas então fica com o controle.
- Eu não quero esse controle. Já está com a sua marca impressa. E outra eu não sei mais como usa um controle. Preciso sair, conhecer novos controles, televisores, me apegar a um canal.
- Você vai acabar com dez anos de casado por causa de um controle remoto.
- Não é o controle remoto, é o que eu perdi por não te-lo.

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- Você fica com o controle da sala eu fico com o controle do quarto.
- Não senhor, você fica com o da sala.
- Mas a TV da sala é muito maior bobinha. E tem muito mais opções de canais.
- Então, fica com ele.
- Não, mas é que eu gosto de algo menor, mais intimista.
- mas você vai passar mais tempo na sala. Dormir assistindo, dormir quando brigarmos, dormir.
- Não tem problema, eu vou respeitar que ele é seu.
- Mas eu não quero, eu quero o do quarto.
- Então não vai dar certo, porque eu também quero.
- E agora?
- Vamos ter que fazer uma guarda compartilhada.
- como assim?
- eu fico com ele segundas, quartas e sextas, você fica terça, quinta e sábados.
- Mas e domingo.
- Domingo a gente deixa num canal só.
- Fechado.
Silencio.
- Agora podemos casar.

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O homem está na sala, a mulher na cozinha.
- Amor, onde ta o controle que tava aqui.
- Ta ai.
- Não ta.
- Nos cantinhos do sofá.
- Não tá.
- Atrás da almofada.
- Não.
- Do lado da TV.
- Não.
- Vê se você não sentou em cima.
- Já vi.
- Veja de novo.
Silencio.
- Não.
Ela vai até a porta da sala.
- Nada.
- Não.
- Vamos ligar pra policia.
- Calma amor.
- Calma não. É a terceira vez que ele some só hoje.
- Temos que ter paciência. Ele é novo aqui.
- Sim, o ultimo também era, até sumir pra sempre.
- Vamos dar uma chance.
- Não, sem chance.
Cade meu celular.
- Não sei.

- Olha ai, esse controle já ta levando meu celular para o mau caminho.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

VESTIBULANDO

- Pai, lembra que o senhor falou que se eu passasse no vestibular iria me dar um carro?
- Sim.
- Então, eu passei.
- Sério.
- Sim.
- Não acredito filho.
- Verdade, tava mantendo segredo, esperando sair o resultado para o senhor não criar expectativa.
- Que alegria, espera só a sua mãe saber.
- Que bom que o senhor ficou feliz pai, eu sabia que ficaria.
Os dois se abraçam.
- Que carro que o pai vai me dar?
- Um carro, bom, alias, você pode escolher.
- sério?
- Sim. Mas não vai escolher um muito caro.
- Nossa pai, nem acredito.
- Nem eu, você é tão burro.
- Oi?
- Nada. Mas e ai, pra o que você passou?
- administração. Nossa, nem acredito que eu vou poder escolher o carro que eu quero.
- Pera aí, administração, pensando bem acho que eu vou escolher o carro pra você.
- Como assim.
- Você passou em que lugar?
- Não me lembro.
- Qual a colocação Rafael?
- centésimo sexto.
- Acho que é melhor pegarmos um semi-novo.
- Mas pai...
- Só um momento, centésimo sexto é segunda chamada, né?
Silencio.
- Acho que é melhor comprarmos uma bicicleta, não acho que o mundo precisa de mais um carro. Bicicleta é o “automóvel” do futuro. Bicicleta é o novo carro.
- Mas o senhor prometeu.
- verdade, verdade. Desculpa. Vamos comprar o carro.
- sério?
- sim.
- Nossa, obrigado pai, juro que não vou escolher um muito caro, vou pegar um bem simples, pra não ficar pesada a parcela do carro mais a mensalidade da faculdade.
- você passou vestibular, de uma universidade particular?
- Sim.
- Sai daqui antes que eu te bata.
- Mas...
- Sai. E não fala nada pra sua mãe.

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O sinal do semáforo esta vermelho. O homem para o carro, um rapaz todo pintado se, com as roupas estropiadas se aproxima do carro.
- Tudo bem, uma moedinha para ajudar um calouro.
O homem remexe no porta trecos do carro a procura de uma moeda. Chega um segundo homem também com as roupas surradas.
- Opa, ajuda com uma moedinha ai patrão.
- Desculpa, é que ele pediu primeiro.
- Ta, mas ele aqui é meu ponto.
- Não, eu não sou mendigo não.
- Então você não precisa do dinheiro. Pode dar pra mim tio.
- Ta, mas eu cheguei primeiro.
- Mas você acabou de falar que não é mendigo.
- Mas também estou pedindo.
- Vai pedir em outro lugar, aqui é meu território. Eu não vou no quintal da sua casa pedir as coisas.
- Mas aqui é a rua
- Sim, é meu quintal.
O motorista acompanha a discussão enquanto procura moedas.
- Eu preciso desse dinheiro para dar pros veteranos.
- E eu preciso para comer.
- Que comer o quê? Você vai é beber, usar drogas.
- Ei pera aí, agora todo mendigo é bebado e drogado?, não é bem assim não.
O sinal já abriu, mas o motorista nem vê, esta prestando atenção na briga. E procurando a moeda. Ele sabe que deve ter alguma em algum lugar.
- Ah não?! Você está aqui por opção.
- Não, porque eu não tive as mesmas oportunidade que você, playboy.
- Como não teve? Existe vestibular para faculdades estaduais, federais, etc.
- Ah, eu não sabia que dava para fazer vestibular tendo parado na quarta série. Me da minha esmola.
- Minha moeda.
A policia para ao lado do carro do motorista/espectador.
- Posso saber o que está acontecendo aqui?
- Nada não.
O motorista arranca com o carro. Com uma moeda de um real na mão. Devolve na bagunça.
- Olha lá, você fez eu perder o dinheiro. Quero ver o que eu vou falar para os veteranos.
- quero ver o que eu vou falar para minha mulher.
- Você tem mulher.
- Mas como você é preconceituoso.

Fecha o semaforo os dois voltam a atividade.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

PÓS REVEILLON

Pós réveillon
- e ai, fez o que de bom na virada?
- dormi e você?
- dormiu?
- sim!, e você?
- mas como assim dormiu?
- do mesmo jeito de sempre, deitei, assisti um pouco de TV e dormi.
- mas no réveillon?
- não.
- ah, bom...
- um pouquinho antes. Tava passando um filme, acho que era umas onze e pouco.
- não acredito que você dormiu.
- meu Deus, por que tanto espanto?
- como assim por quê, porque é virada, um novo ano, réveillon.
- e?
- e que não pode.
- não?
- não!
- mas por que não?
- porque não pode. Da azar. Receber o ano novo o ano novo dormindo.
- não to entendendo o mal de fazer isso.
- é isso que você quer?
- isso que eu quero o quê?
- pra 2014.
- isso o quê?
- isso cara... isso. Prepara seu ano.
- preparar por quê?
- não vai ser um ano bom, não pode ser, entrar dormindo não pode ser bom.
- onde você passou?
- na praia vendo os fogos.
- você pegou transito indo?
- sim.
- e a casa onde você estava, tava lotada?
- sim.
- a praia cheia, muvuca, um monte de gente que você nunca viu.
- sim...
- e você pegou transito voltando?
- sim.
- olha, então acho que o seu ano começou muito pior, o meu eu acordei bem descansado, tomei um bom café e só tem acontecido coisas boas.
Fala e sai.

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10 minutos depois da meia noite
- e ai, ta sentindo?
- não.
- vamos esperar mais um pouco.
Mais 10 minutos.
- nada?
- nada.
Silencio.
30 minutos depois.
Um olha para o outro, ambos balançam a cabeça negativamente.
- é, acho 2014 vai continuar igual 2013.

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10 minutos depois da virada
- nossa, já sinto tudo diferente.
- tudo o quê?
- tudo, o novo ano novo, a vida nova, novos ares.
- eu não to vendo diferença nenhuma.
- impossível, respira.
Da uma fungada.
- nada.
- seu relógio biológico deve estar atrasado.
- não, é a mesma coisa amor. Como se fosse um dia normal só que com fogos, roupa branca e champanhe.
- por que você faz isso Ronaldo?
- isso o quê?
- isso de estragar com tudo.
- meu Deus, o que é que eu estou estragando.
- meu ano, mais um ano. Você consegue.
- o que eu to fazendo?
- estragando o meu ano, alias, já estragou. Já era, fazem dez minutos que começou o ano e você já conseguiu. Muito obrigado.
- minha nossa, eu só falei isso porque pra mim continua a mesma coisa.
- lógico você não muda. Não muda tua atitude. Ai tudo continua a mesma coisa mesmo.
Silencio.
- acho que estou sentindo.
- nem vem porque agora só vai dar pra sentir ano que vem. Esse ano já era.

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SIMPATIAS DE ANO NOVO
Maria - pulei as 7 ondas, comi as 12 uvas, um prato de lentilha, coloquei as duas folhas de louro na carteira e um punhado de arroz no bolso.

Claudia - pulei as 12 ondas, comi as 7 uvas, comi um prato de arroz, coloquei a folha de louro na carteira e o punhado de lentilha no bolso.

Elmira - já pulei as duas ondas, comi um punhado de lentilhas, coloquei sete uvas na carteira, duas folhas de louro no bolso e joguei fora doze punhados de arroz.

Mirtes - já pulei as sete uvas, comi duas ondas, coloquei um punhado de arroz na carteira, comi um prato de louro (engasgando) e coloquei lentilha no bolso.

Ana - pulei as sete folhas de louro, comi os doze pratos de arroz, coloquei as duas lentilhas na carteira e um punhado de louro no bolso.


Claudete - pulei as doze folhas de louro, comi os doze pratos de lentilha, coloquei as duas ondas na carteira, as sete uvas num bolso e o droga esqueci o punhado de arroz no fogo.